A Incrível História de Henry Sugar
Por: Alberto Gallo – Especialista em Gestão Pública e Pesquisador PPED UFRJ
Fotos: Divulgação
Publicado em: 8 de dezembro de 2024 às 21:43
Muito interessante o filme do cineasta americano, Wes Anderson, o mesmo do premiado “Grande Hotel Budapeste”, um diretor que possui um ritmo próprio, colorido e com uma estética de fantasia; e que aborda temas filosóficos e com uma dinâmica profunda.
Aqui não há uma crítica cinematográfica, mas o filme de 2023, “A incrível história de Henry Sugar”, que está disponível na Netflix é uma provocação muito interessante para entendermos o sentido maior em compartilharmos os dotes e atributos que recebemos, para depois, dividirmos com a comunidade mais em volta, e até alcançarmos aqueles longínquos mais necessitados.
Na visão cristã, há o entendimento de que os dons e a riqueza que desenvolvemos são talentos que recebemos e provém da Graça Divina. Sejam os dons naturais ou espirituais, cada habilidade é vista como uma dádiva divina que deve ser usada não apenas para benefício próprio, mas para o bem comum.
Essa visão promove uma atitude de serviço e responsabilidade no uso dos recursos pessoais. A caridade é, portanto, continuidade da manifestação do amor de Deus.
A filantropia, portanto, não é vista apenas como uma ação humanitária, mas como um reflexo do caráter divino e uma resposta ao amor recebido de Deus. Isso confere à prática filantrópica uma dimensão espiritual e transcendente. E aqui vale observar que, não consideramos a riqueza ou as habilidades apenas como uma virtude recebida pronta.
Ao contrário, cada ser recebe um potencial que deve ser desenvolvido com trabalho, estudo, dedicação, resiliência e esforço. Muitas conquistas humanas, pessoais e coletivas, são frutos de oportunidades e “potenciais” que puderam florescer em circunstâncias favoráveis.
Pode haver sim, questionamento da falta de equidade em termos de oportunidades dentro da nossa sociedade tão desigual ainda, para que os verdadeiros talentos possam se sobressair e serem contemplados plenamente.
Os que nascem em ambientes mais propícios, dentro de famílias mais organizadas, ou com maior acesso à educação e segurança social, têm mais chances de galgarem o pódio, como já é de praxe.
É inevitável esse questionamento, além de complexo, já que o amor de Deus é igualmente pleno para todos. No entanto, podemos ter duas chaves de entendimento.
- Primeiro: é que Deus é soberano e justo em todas as suas ações, e que não temos o conhecimento dos desafios de cada um e da providência Divina. Em Lc 12, 48 está claro que: “Aquele a quem muito foi dado, muito lhe será exigido; e àquele a quem muito se confia, muito mais lhe pedirão” Então, na sabedoria de Deus, há uma régua de maior exigência, para alguns, a quem muito foi confiado, e que serão cobrados pelo bom uso destes dons.
- Um segundo ponto, de acordo com São Tomás de Aquino, a distribuição de diferentes dotes entre às pessoas, é parte do plano divino e já tem um propósito específico. Ele aborda essa questão em sua obra Suma Teológica, onde desenvolve alguns pontos importantes, como a Origem Divina dos Dons, um propósito comunitário, uma visão de diversidade e complementaridade.
Voltando à história do filme de Wes Anderson, baseado no conto do escritor inglês Roald Dahl, temos a narrativa que conta história de Henry Sugar, interpretado por Benedict Cumberbatch, um homem rico e egoísta que vive para o jogo de cassinos.
Há combinação de elementos de fantasia e da comédia, explorando temas como ganância, auto descoberta e a moralidade do uso de habilidades extraordinárias e dons que recebemos ou desenvolvemos na vida e do sentido que se dá à riqueza conquistada. O espectador é levado a conhecer não apenas a jornada de Henry, mas também a história de Imdad Khan (Ben Kingsley), que revela o processo pelo qual adquiriu suas habilidades de ver sem precisar dos olhos. O filme é marcado por diálogos rápidos e uma estética teatral vibrante, típica do estilo visual distintivo de Anderson.
O principal tema discutido é o uso responsável das habilidades e talentos. Embora Henry, inicialmente use sua nova habilidade para ganhar dinheiro fácil, ele logo percebe que essa busca por riqueza material não traz a verdadeira satisfação.
Em um momento de epifania, ele decide usar seus ganhos para financiar hospitais e orfanatos ao redor do mundo. Essa transformação moral sugere que as habilidades devem ser empregadas para trazerem o bem comum, e não apenas para interesses pessoais.
O filme não apenas entretém, mas também provoca reflexões profundas sobre moralidade, uso dos talentos e a busca por significado na vida.
Ao final da jornada de Henry Sugar, fica claro que a verdadeira riqueza reside na capacidade de transformar vidas através das habilidades que possuímos.
Essa obra é uma celebração da criatividade e da reflexão ética em um formato acessível e encantador.
Para alguns, é a capacidade de trabalho e administração dos recursos que lhes permite multiplicar seus bens materiais.
Para outros, é a capacidade de apreender conhecimentos novos e ensiná-los, seja como professores ou multiplicadores de talentos.
Outros, porém, podem até curar, ajudando na saúde e no bem-estar, de quem precisa.
Todos nós recebemos predicados em diferentes proporções e circunstâncias, e cujo desafio é de compartilhar com os demais.
Somos, portanto, “afortunados”, e faz todo sentido plantar estas sementes para que possam florescer por muitas gerações.