As mil e uma mortes da vereadora carioca, Marielle Franco

marielle-franco
Marielle Desenho
marielle-franco2-1024x576
marielle-franco Marielle Desenho marielle-franco2-1024x576

Por: Siro Darlan

Publicado
01/03/2024 às 16:07

O Processo de Kafka torna-se regra quando se pretende assassinar reputações.

“O Processo” a obra de Franz Kafka escritor tcheco do século IXX, citado nesse Artigo como analogia, tão ilustrativa aos nossos tempos, é quando o personagem central se vê obrigado a lutar o tempo todo para descobrir do que estava sendo acusado, quem o acusava e que lei justificava tal situação.

No caso de Marielle, que não descansa em paz por vários motivos, dentre os quais pela inoperância das autoridades responsáveis pelas investigações, que a toda hora gira a roleta das probabilidades apontando diversos nomes, sem qualquer prova do que divulgam, como foi o caso do Vereador Marcello Secciliano,  do Orlando Curicica, a Milícia do Campinho, dentre outros.
Cada vez que apontam para uma pessoa, destroem reputações e promovem humilhações a terceiros não envolvidos, como familiares desses “suspeitos”, mas sobretudo aos parentes das vítimas, que veem nessa inoperância uma nova morte para seus entes queridos.

Apontando a roleta russa para possíveis suspeitos, além de mostrar como as investigações estão perdidas, confirmam as estatísticas de que a cada três homicídios no Brasil, apenas um é solucionado e identificados seus autores. No Brasil a taxa de resolução de assassinatos, segundo o Instituto “Sou da Paz” é de 35%, contra a média global de 63%.

Na maioria das tentativas de dar publicidade às investigações que deveriam ser sigilosas, mas que são propositalmente vazadas, com o intuito de não dar em nada.Os investigadores miram seus alvos contra pessoas, atingindo sua reputação e sobretudo causando danos irreparáveis a seus familiares, que sofrem os efeitos colaterais desse teatro dos horrores. Não é que o aparato policial seja incompetente, trata-se de alguns agentes interessados, com objetivos escusos, em “melar” as investigações para não se chegar aos responsáveis por esse bárbaro duplo crime político.

Uma das causas é porque Marielle, por sua brava luta, e por que ela representava de mudança na política, pertencia à categoria dos “matáveis”. E assim como milhares de cidadãos pobres e negros morrem diariamente vítimas desse tipo de violência, não interessa aos “responsáveis” encontrar os mandantes.

O law-fare, essa forma devastadora de destruir reputações, age como um mecanismo que conduz a opinião pública a acreditar e agir contra seus próprios interesses pessoais e sociais. Essa engrenagem perversa não apenas promove, mas induz que agentes mal-intencionados escolham seus inimigos de ocasião, utilizando-se de seus cargos na Polícia, Ministério Público e da própria Justiça, instituições republicanas, fundamentais para a Ordem Pública, sirvam para promoção de seus interesses individuais e egoístas.
Apresentando-se como paladinos da justiça, defensores dos cidadãos comuns, estão na verdade homologando seus instrumentos para destruir a credibilidade das instituições, espalhando mentiras e atirando contra qualquer um que esteja em seu caminho.

O trágico, é que muitas vezes os próprios cidadãos vitimados aplaudem esses modelos autoritários e de ação policialesca, acelerando o processo que se volta contra si mesmos. Essa é a nova forma de flagelo, chamada por algumas autoridades de moderno “pau-de-arara” que promove tortura física e psicológica, além de uma falsa impressão de competência profissional. Trata-se de uma guerra jurídico midiática voltada para desestabilização de figuras públicas, políticas ou de outras atividades intelectuais, como professores e jornalistas sérios e comprometidos com a verdade.

A mais recente vítima criada pela inoperância das investigações é o Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro Domingos Brazão, que concedeu recentemente entrevista exclusiva ao Portal UOL, gerando um alcance de mais de 5,9 mil visualizações na plataforma, produzindo assim, uma importante fonte de informação para a audiência do Canal.

O Conselheiro, como disse na ocasião, estava numa consulta médica, mas não se furtou a prestar os esclarecimentos. Foi uma entrevista sem afagos, muito dura, pois quase todas as suas falas, foram contestadas com argumentos falaciosos e despossuídos de quaisquer elementos probatórios.

Logo se vê que o objetivo da entrevista não era que o “acusado” pelo Tribunal Midiático, explicasse sua versão do fato diante de uma imprensa isenta. Na realidade, o que mais parecia era que estava sendo “interrogado”, e interrogatório é uma peça de defesa, não podia dar sua versão porque seus inquisidores não deixavam, sobretudo um deles que parecia conhecer mais de Direito que os Ministro do STJ, que havia absolvido o Conselheiro de um fato que lhe fora atribuído no passado.

O julgamento era antigo e transitara em julgado, mas para os “agentes do law-fare” essa é uma técnica usual. O tema da entrevista era a todo momento desviado para confundir o entrevistado e induzir os internautas a um posicionamento parcial, como se nota nos comentários.

Por exemplo, uma das perguntas dirigidas ao Conselheiro era a seguinte: “Porque seu nome aparece nas investigações sobre a morte de Marielle e Anderson, e em seguida: “Porque Lessa o apontou como mandante”?

Enquanto o entrevistado procurava responder, surgiam indagações de fatos não relacionados, como um debate parlamentar acalorado com a Deputada Cidinha Campos ocorrido há mais de vinte anos, sobre um crime atribuído ao Conselheiro, e já absolvido pelo Judiciário.

Como afirmou o Padre Antônio Vieira em pleno século XVII, no terceiro domingo da quaresma, na Capela Real de Lisboa, era que: “Três dedos de uma pena na mão é o oficio mais arriscado que tem o governo humano. Quantos delitos são feitos com uma penada? Quantos merecimentos se apagam com uma risca? Quantas famas se escurecem com o borrão”?

Já advertia Vieira naquela época, o que hoje é uma prática corriqueira em grande parcela da mídia mundial. O que se constrói durante anos pode ser destruído com apenas uma Live, um like nas Redes Sociais, nos dias atuais.
Por isso, a obra de Kafka, descrita em “O Processo” é muito ilustrativa nesse contexto, quando trata-se de tomar como regra o assassinato de reputações.

Ironicamente, não é mais necessário que existam provas de um criminoso na busca de reduzir sua pena, ou mesmo apagar o seu crime, para depois de torturado pela prisão justa ou não, resolver “negociar uma delação” envolvendo o eleito para o cadafalso. Não se questiona mais por provas, bastam convicções.

E assim, caminha a humanidade, apesar da advertência de Vieira em seus sermões.

Não importam quantas vítimas fiquem pelo caminho, sejam adultos, crianças, idosos, doentes, desde que a sede dos abutres por noticiais espetaculosas continuem alimentando o circo dos horrores!

×